sábado, 30 de abril de 2016

A Alegria das Pequenas Coisas


Há alguns dias, resolvi preparar alguns biscoitos para minhas filhas, como contraponto à rotina de trabalho. E aproveitando as facilidades da tecnologia, encontrei rapidamente um vídeo ensinando a fazer cookies de chocolate.
Os ingredientes estavam facilmente à disposição no supermercado próximo de minha casa, e ante a notícia do que iria fazer, consegui logo 3 ajudantes mirins (minhas duas pequenas, e uma visitante que ficou sabendo e veio mais que depressa).
Em pouco tempo, descobri o quão divertido pode ser ir para a cozinha (e mais ainda com a ajuda delas), e logo estávamos os 4 a curtir alegres (e deliciosos) momentos de preparação e, finalmente, de degustação dos ansiados cookies de chocolate.
Enquanto fazia os biscoitos, na confusão de vasilhas e da batedeira sujas, por mais de uma vez tive de afastar o pensamento de que teria sido bem mais fácil levá-las ao shopping e comprar cookies e, qualquer outra coisa, prontos. E por mais de uma vez tive de resgatar a ideia original, de que estava ali por outro motivo, e não simplesmente preparando um lanche.
E depois disso, refleti sobre o motivo de termos poucos desses momentos; momentos de alegria tirados de circunstâncias simples e despretensiosas. E um deles, percebi, é a ânsia de buscar o fácil e o cômodo do pronto, quando poderíamos ter o alegre e divertido do aprender a fazer.
Nós nos acostumamos ao fast food e ao fast tudo. Acreditamos na propaganda massiva que nos convenceu de que para ser felizes precisamos ter aquele apartamento, aquele carro, ir àqueles lugares, comer aquelas comidas e, até mesmo, ser daquele jeito. É tudo vendido pronto, facilmente ao alcance de todos (que tenham o dinheiro suficiente, claro). Mas conquistar essa quantidade de coisas, para a imensa maioria de nós, é simplesmente impossível.
Mas porque acreditamos nisso, corremos a buscar ter as coisas das quais realmente não precisamos, e nos endividamos. Vamos a muitos lugares, e parece tudo igual. Alimentamo-nos com comidas que não nos fazem bem, e adoecemos. Esforçamo-nos por impressionar as pessoas com uma aparência e comportamentos que não convencem nem a nós mesmos, e depois..., ficamos tristes.
É que, convencidos pela enganosa propaganda, passamos a acreditar apenas na força do dinheiro, como fator de felicidade. Perdemos a capacidade de olhar ao redor e ver a força das pequenas coisas que estão aí (mas a cada dia menos). Estão esperando que voltemos a vê-las. Depois descobrimos que a felicidade não é o resultado do acúmulo, pois se fosse, todos os ricos seriam felizes. E a realidade, é que muitos, confessadamente, não o são.
O engano tomou tal proporção, que já não sabemos mesmo do que realmente gostamos. E nosso gosto passa a variar com a moda, tão artificial quanto as comidas coloridas que ingerimos.
Ouvimos músicas (será que podem ser chamadas assim?) porque todo mundo está ouvindo. Mas quem foi que começou a ouvir? Tinham bom gosto essas pessoas? E existe o bom gosto, ou qualquer gosto é válido?
Nós assistimos a programas de TV porque é o que está passando. Mas quem decidiu o que passar? Baseado em que critério? Tinha a intenção de nos fazer aprender boas coisas?
Diziam os antigos filósofos que as ideias, assim como os alimentos, modificam-nos. Se comermos coisas ruins, nossa saúde se degrada. E se assistimos, ouvimos e lemos coisas de má qualidade, o que ocorre?
Compramos telefones inteligentes (smart phones), e nos tornamos aficionados a eles ao ponto de já não olharmos direito ao redor (será que são mais smart do que nós?), de estar presos às telas com se a vida estivesse lá dentro, e fosse mais importante se manter conectados à vida lá, do que à vida que temos ao nosso redor. E é cada vez mais comum ver um grupo de pessoas mudas, ao redor de uma mesa num café, presos às telas de seus aparelhos, como uma nova forma de vício (e por falar em vícios... melhor deixar para outro dia).
Não é minha pretensão dar alguma receita de felicidade (mas pode me pedir a dos cookies, se quiser), mas apenas chamar a atenção do leitor para algo simples e verdadeiro: É que, se não temos à vista a felicidade, que é algo grande, podemos ter, com facilidade, muitos momentos de alegria, todos os dias, se soubermos apenas apreciar as pequenas coisas e momentos que nos cercam cotidianamente.
Há que deixar de lado as neuroses da pressa, do que nos falta comprar, e a ânsia por estar em outro lugar fazendo outra coisa. Curtir mais o que temos ao nosso redor, as pessoas que convivem conosco, as coisas que já temos e o clima da estação. Fazer, se possível, antes que comprar ou contratar. Ler bons livros, ao invés de assistir a uma programação de gosto duvidoso na TV. Conversar com as pessoas sem segundas intenções, mas com sinceridade, querendo compreender a tudo e a todos.
Enfim, se trata de apreciar a vida de forma natural, com o que ela nos traz. Aprender dela com a curiosidade de uma criança que recém iniciou seus estudos. E gostar do que aprendemos mais do que de coisas. Pois ao final, o que levaremos conosco da vida? Certamente não as coisas que tenhamos acumulado.
E não poderia ser essa uma forma da felicidade? (porque penso que pode haver outras): uma vida de momentos alegres, unidos por um propósito de vida honesto.
E se tivermos que nos atribular, que seja pelas coisas válidas, pelo que realmente conta e faz falta: pela paz, pelo amor, pela educação, pelo direito a viver de forma digna.
E se tivermos de lutar, que seja pelo Bem e pela Justiça.
Como diziam os antigos romanos, carpe diem (aproveite o dia), e seja feliz.

Jean Cesar Antunes Lima

Professor de filosofia em Nova Acrópole

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