quarta-feira, 24 de setembro de 2014

O futuro, desde sempre, mergulha suas raízes no presente...

No  livro  “A  Luz  da  Ásia”,  onde  se  conta  de  forma muito bela  a  vida  do  Budha,  o  autor  coloca  nos  lábios  deste mestre oriental  a  frase  que  serve  de  título  a  este  artigo:  “  Se  o
futuro  não  encontra  raízes  no  presente,  como  germinará,  no tempo que virá? Aquilo que é, de uma certa maneira,  sempre foi...”  Como  filósofa,  proponho  tomarmos  esta  ideia  como
possibilidade  e  usarmos  algo  do  nosso  tempo  para  examinar esta questão das sementes que plantamos e das colheitas que temos feito.

Se  pararmos  para  procurar,  talvez  vejamos  que  alguns dos momentos mais interessantes  da  nossa vida, as  sementes mais  promissoras,  sejam  aquelas  que  nascem  no  terreno da  maturidade  que  vamos  adquirindo:  um  pouco  mais  de compreensão do  tamanho do drama humano, um pouco mais de  valorização  de  suas  pequenas  iniciativas  para  se  sobrepor ao  meio  e  a  si  mesmo,  um  pouco  mais  de  compaixão  pela nossa  pouca  memória,  pois  já  ouvimos  tantas  boas  “receitas de  bolo”, mas  insistimos  em  começar  do  zero,  desperdiçando ingredientes,  tempo,  Fogo...    E  também  um  pouco  menos  de ansiedade  para  valorizar  os  avanços  instáveis  e  inseguros  dos primeiros passos, em cada nova conquista, sabendo que a vida estará sempre demandando paciência para os primeiros passos e aceitação para os últimos; um pouco menos de crueldade, ao julgarmos uns aos outros, e de firmeza, para conduzirmos a nós mesmos...  Tantas  coisas,  pequenas,  mas  valiosas,  creio,  como são as sementes. São como primeiros  trinados da voz da alma humana, que se esforça por achar a nota.

Fico  imaginando  se,  ao  invés  de  ambições  malucas  e vaidades duvidosas, aceitássemos apenas isso: gerar pequenas sementes,  belas  e  consistentes;  pequenos,  mas  melodiosos “vocalizes”,  onde  nossa  alma  emitisse  seus  primeiros  sons. Um dia, haverá árvores e haverá árias, sombras acolhedoras e sons  melodiosos.    Que  a  maturidade  nos  permita  amar  estes frutos que serão colhidos no futuro por outras mãos, mas que, para isso,  necessitam, neste momento, mergulhar  suas  raízes profundamente dentro de nós. A semente é minúscula, mas o sonho que ela representa, não.

Talvez isso pareça um sonho modesto, porque perdemos o  foco,  em  nossos  dias:  esquecemos  que  a  única  obra  válida e  perdurável  do  homem  é  a  construção  do  próprio  homem de  uma  forma  irônica e até  um  tanto absurda,  trabalhar  para qualificar  a  humanidade  deixou  de  ser  uma  meta  relevante... para  a  humanidade.  Daí,  o  paradoxo  atual:  não  vivemos  uma época “estéril”, no sentido de que as sementes que plantamos têm  sido  colhidas  abundantemente:  muita  tecnologia,  muitos meios de comunicação (e tão pouco de válido a dizer!), muitas novas  formas  de  entretenimento  para  aqueles  cuja  vida consiste apenas em “passar o tempo” agradavelmente.

Porém, se há tantos frutos, por que será que continuamos nos sentindo  de mãos  vazias,  com  vidas  vazias,  falando  palavras... vazias?  Talvez  haja  que  prestar  mais  atenção  nessa  óbvia e  bela  relação  entre  sementes  plantadas  x  frutos  colhidos. Talvez  haja  que  perceber  que,  queiramos  ou  não,  tenhamos ou não consciência,  toda nossa vida  se divide entre colheita e semeadura.

Há  uma  passagem  de  uma  muito  popular  canção  que indaga,  desafiadoramente:  “Você  tem  fome  de  quê?”  Sem dúvidas, uma boa pergunta... pense nela, antes de escolher as sementes  que  serão  seu  rastro  neste  dia,  neste  ciclo...  nesta vida;  que  tipo  de  fome  elas  saciarão,  no  futuro?  É  justo  e necessário  cuidar  das  sementes  que matam a  fome  do  corpo; mas  a  alma  também  sofre  de  inanição,  e  um mundo  humano sem  alma  oferece  o  mais  triste  e  amargo  espetáculo  que  se possa imaginar.

Professora e Diretora adjunta de Nova Acrópole
Lúcia Helena Galvão
luciahga@hotmail.com

quarta-feira, 17 de setembro de 2014

A cortesia


Começaremos esclarecendo que o verdadeiro sentido etimológico e ideológico da palavra "cortesia" nos vem das antigas "cortes", lugares habitualmente usados por filósofos, artistas, literatos, políticos, economistas, juízes, médicos e, em geral, todos os profissionais e pessoas distintas a quem correspondia tomar as considerações e decisões em um estado ou reino, em uma, como dizia Platão, congregação; quem, por seus talentos, saberes e habilidades, prestavam um serviço público à sociedade; os que estavam encarregados do estado, palavra que, em latim, se transformou em "res pública" (da coisa pública), de onde vem a palavra "República".
Em todas as antigas culturas e civilizações que conhecemos, ainda que parcialmente, existia uma forma "cortês" de relações entre as pessoas. Na chamada idade Média do Ocidente, o cortês se configurou em círculos mais fechados de comunicação entre damas e Cavalheiros e destes entre si, desde a formação como pajens até a culminação como cavalheiros.
Desgradaçadamente, com o andar do tempo, muitas dessas sãs e úteis tradições caíram em desuso e também na degeneração, promovendo costumes falsos e mentirosos. Esta última imagem é a que nos tem chegado através da comunicação massiva. E hoje, sobretudo entre os medianamente jovens, os que sofreram a deformação do pós-guerra, a cortesia aparece como um sinônimo de falsidade e falta de autenticidade.
Nós, filósofos, queremos resgatar e gerar formas de cortesia que nos afastem da animalidade estupidizante e do enfado do meramente instintivo.
A cortesia é, por sua vez, uma forma de generosidade e de amor. Um reconhecimento da fraternidade universal para além de todas as diferenças de classes, etnias, sexos, condições sociais e econômicas. É uma maneira humilde, mas agradável de aplicarmos nosso primeiro princípio:
Reunir aos homens e mulheres de todas as crenças, raças e condições sociais em torno de um ideal de fraternidadeuniversal.
Assim como, quando damos um presente, por pobre que este seja, costumamos cobri-lo de papéis e fitas coloridas, de maneira que antes de chegar ao objeto em si, o destinatário tenha a sensação de que pensamos carinhosamente nele e que nos preocupamos em expressar-lhe nossos sentimentos afetuosos e nossos bons desejos. Toda palavra e ação devem estar prudentemente envoltas de nossa capacidade de dar e amar.
Não se é menos homem ou menos mulher por superar rusticidades. Ao contrário, são o cavalheiro e a dama mais eficazes e agradáveis se põem em tudo que fazem uma pitada de beleza, de amor e de cortesia. Saudarmo-nos com um aperto de mãos, um abraço ou um beijo, conforme sejam as circunstancias e os atores, e por "ator" devemos entender o que o Imperador Augusto entendia: partícipes ativos e eficazes da vida... O que faz algo, o verdadeiro "Ator", segundo o teatro "Mistérico", é o que representa as coisas, o que as apresenta de novo, mas agora com uma carga de interpretação humana que as melhora, embeleza e enobrece, de modo que todos possam participar de alguma maneira delas.
Deveríamos nos esforçar em deixar fora todo gesto de ira e amargura, de ódio ou de rancor. Esta atitude, mesmo que se comece de forma meramente externa, se se mantém com força e perseverança, chega a atingir patamares mais profundos, e como o palhaço dos contos, de tanto sorrir e fazer rir, acaba por contagiar-se a si mesmo com sua alegria e encontra consolo para as desventuras da vida.
Existem muitas "ideologias" políticas e religiosas que têm provocado genocídios e tem feito muitas pessoas chorarem. Façamos nós o contrário; tragamos alegria, paz, concórdia, prosperidade. Um filósofo triste por circunstâncias banais, não é um verdadeiro filósofo; é menos ainda, se o demonstra e anda chorando suas penas a todas as suas amizades, dando sinais de frouxura, impotência espiritual e debilidade vampirizante.
Acostumemo-nos a dar antes de pedir.
Evitemos julgas os demais à luz de nosso ainda nascente discernimento, abundantemente deformado por nossas paixões. Sejamos fortes e verticais.
No mundo já há mendigos demais... Não sejamos um deles.
Não me refiro tão somente ao plano econômico, mas sim ao global. Ofereçamos as mãos cheias! Nossa energia, nossa bondade e boa vontade para todos. Trabalhemos muito. Estudemos, pensemos e oremos o necessário..., mas, acima de todas essas coisas, rompamos nossos modelos de egocentrismo, com Humildade de Coração, que não é do corpo e dos trapos. Sejamos corteses... Façamos realmente e todos os dias um mundo novo e melhor... E vivamos nele.

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Por que é tão difícil alcançarmos o bem-estar?

Por que é tão difícil alcançarmos o bem-estar? Será que nossa busca é infrutífera porque o estamos procurando no lugar errado e agindo de maneira equivocada para encontrá-lo? Há um interessante alerta sobre que só conseguiremos atingir o bem-estar se a nossa busca for de dentro para fora. Assim, o bem-estar verdadeiro e duradouro é aquele que vem da nossa alma, pois todos os outros, baseados em fatores externos, estão fora do nosso controle. Veja abaixo artigo completo sobre o tema escrito pela diretora da organização internacional filosófica Nova Acrópole.
Vivemos em um mundo em que o bem-estar se converteu no principal artigo de consumo. Ao menos, é o que acontece nos chamados países desenvolvidos. A publicidade nos assedia em todos os cantos oferecendo-nos melhores possibilidades de vida em todos os aspectos: físico, emocional e intelectual, convidando as pessoas a buscarem nessa comodidade a fonte de toda felicidade.
O estado de bem-estar
Não é estranho que para muitos essa busca se converta no motivo de sua existência. O bem-estar geral é o que evita todos os problemas e afasta todas as dores.
Entretanto, a vida cotidiana e real nos mostra um panorama bem diferente. Buscar o bem-estar é uma corrida sem fim, porque, quando se acredita ter achado algo, surgem novas e peremptórias exigências que nos obrigam a mais e mais coisas. Assim, o bem-estar se afasta e se torna uma meta inalcançável, ainda que desejável.
No plano material, obter benefícios e posses é como beber de uma água que dá mais sede ao invés de acalmá-la. Ninguém se sente satisfeito com o que tem, porque todo o sistema de propaganda está montado de modo que seja necessário ter cada vez mais bens para sentir-se melhor. As falsas necessidades levam toda a energia, enquanto as pessoas sonham com o instante em que, por fim, terão tudo o que desejam.
No plano psicológico, o desejo de bem-estar costuma manifestar-se como uma fuga de toda preocupação, de todo compromisso. Pretende-se uma tranquilidade que demora a surgir porque a vida está cheia  dessas  aparentes ansiedades, que não são outra coisa que provas precisamente para adestrar-nos  na arte de viver. Quanto mais não se quer sofrer, mais se sofre. Quanto mais se trata de afastar-se das turbulências emocionais,  com mais força elas assediam ao incauto que as repele.  Ninguém quer aprender a dominar as turbulências, mas encontrar um caminho que esteja livre delas. É como desejar um rio sem correnteza, um mar sem ondas, um cume de montanha sem ventos. Tampouco se trata de frear as correntezas, as ondas ou os ventos, mas, sim, aprender a viver com eles, a usar a inteligência para compartilhar nossa existência com esses fenômenos naturais dos quais habilmente podemos nos proteger, mas não escapar, aproveitá-los sem fugir.
No plano mental, o bem-estar é o não pensar. As ideias incomodam porque vêm carregadas de perguntas. E quando as perguntas ficam sem respostas, chega a angústia. Assim, é melhor que outros pensem por nós e que nos deixemos levar por esquemas pré-fabricados, por correntes de opinião que costumam ser mais perigosas que as correntes dos rios, as ondas e os ventos.
Em resumo, o conceito usual de bem-estar se converteu em sinônimo de suavidade, em uma preguiça que se apodera da pessoa inteira, em todos os seus aspectos e a torna inútil e incompetente para viver sem as muletas cada vez mais numerosas que refletem uma satisfação cada vez mais distante.
Por que o desejo de bem-estar é uma mostra de carência? Em princípio, porque todo desejo indica o que não temos; jamais desejamos o que já é nosso. Quer dizer que carecemos de bem-estar. Como vimos antes, costumamos buscá-lo por caminhos equivocados, mas o certo é que não o temos.
Por que é um sinal de debilidade? Porque falta segurança em si mesmo, porque se tem necessidade de suportes externos à personalidade para sentir-se firme, porque não costuma haver coragem para encontrar-se consigo mesmo, ou seja, ao invés de descobrir-se interiormente acha melhor alimentar o vazio interior. Só sem esse vazio e sem os suportes artificiais, é possível percorrer o complexo, mas interessante caminho da vida.
Aquele que busque apaixonadamente, desesperadamente, um bem-estar, que está fora de si mesmo, entrará  em um labirinto de difícil saída, tanto que poderá passar toda uma existência percorrendo vias erradas que conduzem a outras mais equivocadas ainda. Aquele que se acha nessa situação, viverá sempre dependendo das pessoas e das circunstâncias; será tão feliz como lhe permitam as pessoas com as quais convive e terá tantas ou tão poucas satisfações como lhe ditem as circunstâncias.
A base de todo bem-estar parte da alma que, nas palavras do Professor Livraga, “não deseja bem-estar porque é naturalmente bem-aventurada”. Isso não significa que o corpo não necessite de determinada quantidade de saúde, repouso, alimentação, ou que a psique não requeira serenidade para ter acesso a sentimentos superiores, ou que a mente deva superar suas dúvidas e vazio adquirindo certezas. Mas nada disso se consegue se não se parte de dentro para fora. “Dentro” é a alma – onde radica por ora nossa consciência, no melhor dos casos – e a alma sabe o que necessita, sempre que não está asfixiada ou relegada pelas exigências da matéria. É preciso buscar na alma a medida de nosso bem-estar, porque a alma, em estado natural, é a fonte de todo bem-estar. E entenda-se por “natural” o estado primordial, perdido e recuperado conscientemente por meio do esforço evolutivo; a naturalidade de hoje é fruto da conquista humana no retorno a suas fontes espirituais.
Sabendo onde achar o bem-estar, é preciso saber buscá-lo e ter presente que toda busca implica um trabalho. Que ninguém possa dizer de nós que não soubemos ou não quisemos trabalhar para chegar à nossa alma. Saber, sabemos onde reside. Trabalhar para encontrá-la é abrir caminho entre as falsas promessas de bem-estar e comodidade paralisante até dar à alma o lugar que lhe corresponde. Até que seja ela quem se expresse por meio de nós, no lugar das sensações e impulsos meramente animais.
E por fim, recordar que uma  vida dedicada a causas nobres, ainda que não isentas de dificuldades, pode nos proporcionar a verdadeira felicidade, sem tensões nem ansiedades; essa felicidade que é o efeito de uma causa justa.
Delia Steinberg Guzmán
Diretora da organização internacional filosófica Nova Acrópole.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Você sabe lidar com situações de crise?

 
Conheça a incrível história de Sir Ernest Shackleton, um exemplo de liderança durante a 'Idade Heroica da Exploração da Antártida'
 
 

Frio, fome, desabrigo e as mais duras situações de adversidade fizeram com que o capitão Sir Ernest Shackleton tivesse o nome marcado na história. Em 1914, a bordo do Endurance, ele partiu em direção ao Atlântico Sul. O objetivo de sua expedição era cruzar o continente Antártico, passando pelo Polo Sul. Mas, pouco antes de alcançar sua base original, o navio ficou preso no gelo. A partir desse evento, a vida da tripulação passou a depender de decisões constantes e difíceis, que fizeram com que a liderança de Shackleton se tornasse um exemplo para a milhares de pessoas.
 
A expedição de Sir Ernest Shackleton, que completa 100 anos em 2014, é o tema central do curso: Aprendendo com a Adversidade, que ocorre nesta sexta-feira (08/08), às 19h, na Nova Acrópole Cuiabá. O evento tem duração de três horas e será ministrado pela professora de filosofia Renata Peluso, de Brasília (DF). O ingresso custa R$15. De acordo com a palestrante, Shackleton é considerado um dos grandes líderes da história e um exemplo de motivação e união de equipes em situações de crise.
 
Albert Einstein dizia que a crise é a melhor benção que pode ocorrer com as pessoas e países, porque a crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia, como o dia nasce da noite escura. É na crise que nascem as invenções, os descobrimentos e as grandes estratégias. Quem supera a crise, supera a si mesmo sem ficar ‘superado’.
 
Para Renata, é mais fácil ser líder quando as situações são tranquilas e rotineiras, no entanto, circunstâncias adversas exigem lideranças diferenciadas. “Alguém que não consiga desenvolver virtudes como organização, persistência, coragem e autocontrole, dificilmente conseguirá superar com êxito uma crise”.
 
Entre as virtudes de Shackleton estava a organização e o discernimento. Além de levantar fundos, o explorador selecionou o grupo com quem iria partilhar a viagem. Eram homens com habilidades técnicas, que também possuíam características muito humanas. Alguns sabiam cantar ou dançar, ou bom-humor, característica importante na convivência. Mas, acima de tudo, todos eram sonhadores e idealistas. “Para o expedicionário essas características eram fundamentais e fariam diferença nas diferentes situações que viriam a seguir”.
 
A Nova Acrópole Cuiabá está localizada na Rua Mané Garrincha, número 82, Bairro: Jardim Alvorada (Atrás do Hospital Universitário Júlio Muller). Mais informações pelo fone: (65) 2129-9002 /9919-1700 ou no facebook.com.br/NovaAcropoleCuiaba.

domingo, 3 de agosto de 2014

A arte de saber escutar

Você sabia que saber escutar é a arte de prestar atenção nos outros? É também um exercício de compreensão, mas que postura devemos ter  para compreender? A postura correta  é sairmos um pouco de nós e nos colocarmos no lugar do outro e desta forma logo percebemos que “Saber escutar é uma maneira de saber falar”. Veja abaixo artigo completo sobre o tema escrito pela diretora da organização internacional filosófica Nova Acrópole.
Aquele que só escuta a si mesmo, o que só aprecia suas próprias ideias e se  sente atraído pelo som de sua própria voz, o que não dá importância à existência de outras pessoas e as usa apenas como tela para refletir suas palavras, jamais poderá conversar, nem iniciar uma relação humana saudável.
É preciso saber escutar. Não é necessário ser mudo nem retraído, mas demonstrar essa faculdade requintada daquele que leva em consideração àquele que tem diante de si, ao que busca uma relação tanto como busca a si próprio.
Escutar é uma arte: requer prestar atenção, avaliar o que os outros nos dizem,  entender porque nos dizem as coisas, ler nos olhos daquele que fala tal como se escutam suas palavras, colaborar em silêncio com gestos que indiquem nossa participação ativa no diálogo.
Escutar é poder comparar o que escutamos com o que pensamos e ter a oportunidade de calibrar, por meio dessa comparação, o peso de nossos pensamentos.
Escutar é saber intervir no momento oportuno, sem interromper bruscamente e sem ignorar o que o outro está dizendo. É responder partindo daquilo que nos foi dito e formar um fio inteligente para que a conversação tenha um sentido, quer dizer, um princípio, um meio e um final.
Escutar é compreender e compreendermo-nos.
Aquele que é capaz de conversar, alternando engenhosamente suas intervenções com a dos demais, aquele que escuta ao outro tanto ou mais do que a si mesmo sabe recolher  tesouros em todos os cantos e em todos os minutos da vida. Desenvolve a observação, a paciência, o respeito e a capacidade de pensar.
Saber escutar é a melhor maneira de saber falar.
Delia Steinberg Guzmán
Diretora da organização internacional filosófica Nova Acrópole.

terça-feira, 29 de julho de 2014

O Poder do Exemplo

Conta Tito Lívio, historiador romano, em seu livro “Os Primeiros Anos da República”, que em 508 a.C. Roma foi cercada por um rei Etrusco de nome Porsena, e que ante o perigo, um jovem romano chamado Caio Múcio Cévola se voluntariou a ir matar o rei, a fim de acabar o mais rapidamente possível com o perigo que a cidade corria.
Mas ao entrar no acampamento inimigo, o jovem guerreiro confundiu um secretário com o próprio rei, porque o secretário se vestia ricamente. E numa investida rápida, matou o secretário, sendo aprisionado em seguida.

Ao ser levado ante o rei, e perguntado sobre a estratégia dos romanos, Caio disse: “Sou um cidadão de Roma, e vim para matar um inimigo ou morrer com valentia, e muitos como eu estão dispostos a fazer o mesmo”.

O rei o ameaçou de queimá-lo vivo se não contasse detalhes dos planos deles, e em seguida, Caio Múcio colocou, ele próprio, a mão direita em um fogo que havia ao seu lado. E a deixou queimar até os ossos diante do rei e de outros nobres, assombrados com tal ato de valentia.
O rei ficou tão impressionado com Caio, que o libertou, e em seguida estabeleceu um tratado de paz com Roma, temeroso de ter que enfrentar homens com aquela coragem.

Conta ainda Tito Lívio, que muitos depois de Caio seguiram e imitaram aquele ato de heroísmo e civilidade. Tendo sido este um dos valores que tornaram Roma séculos depois um grande império.
Não foi Caio Múcio o único herói de Roma, muitos houve antes e depois dele, e por sua presença Roma pôde ser grande. Na realidade, se estudarmos com seriedade a história humana, veremos que qualquer civilização passada, e inclusive a nossa, só pôde conquistar esta condição em virtude de grandes exemplos de heroísmo, justiça, bondade, tolerância, respeito e etc. Exemplos dados por grandes homens e mulheres que se sacrificaram a fim de permitir que o futuro pudesse ser melhor que a época em que viveram.

Infelizes daqueles que acreditam no invertido ditado: “melhor um covarde vivo que um herói morto”, pois por causa de sua covardia os estados caem, e as civilizações morrem. No exemplo está o poder que permite a evolução humana e o desenvolvimento civilizatório.

Se hoje não pudermos estar à altura de exemplos como o daquele jovem patrício romano, por falta de pessoas com tal estatura, que ao menos sejamos capazes de nos orientar por eles, de buscar a virtude que eles inspiram. E não os exemplos contrários, que infelizmente nos são dados todos os dias por aqueles que deveriam estar zelando pela justiça e pela segurança em nosso estado. Exemplos de pessoas que se norteiam pelo infeliz ditado citado acima.

Os exemplos de todos os grandes homens e mulheres sempre foram de busca dos valores humanos; das virtudes do Bem e da Justiça. Numa época em que os heróis são pura fantasia midiática ou rostos bonitos no hall da fama, não acredite, caro leitor, que por isso, valores como honra e coragem sejam artigos passados de moda, e já não cumpram mais papel em nosso mundo moderno.

Saiba que, pelo contrário, é apenas na manutenção destes valores que nossos filhos poderão chegar a viver em um mundo melhor, aquele que todos nós sonhamos, e que muitos, já não creem ser possível.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Filosofia e seitas: uma reflexão útil

Uma das polêmicas mais acirradas que circulam hoje sobre o significado de palavras em geral gravita em torno da palavra “seita”. Proveniente do latim sequire , "seguir", normalmente trata, em uso corrente, de ideologias divergentes da oficial e com tendência ao isolamento social; em extremo, podem se referir a grupos que cultivam excessiva devoção e obediência um líder, de quem são “seguidores”, com uso de técnicas de persuasão opressivas ou manipuladoras.

Como mesmo estes adjetivos são todos muito cheios de matizes, a se prolongar neste assunto, cairíamos num sem-fim de etimologias e conceitos discutíveis, mas não é este o nosso objetivo, senão perceber o que propõem, não as “filosofias”, pois é outro escorregadio conceito, uma vez que todo conjunto de ideias, homogêneo e coerente ou não, se intitula desta maneira, mas a Filosofia, tradicional e clássica, com a proposta que a trouxe à vida, e se isso se assemelha em alguma medida às chamadas “seitas’.

Penso que podemos nos apoiar em um dos mais conhecidos pensadores da humanidade, Sócrates, em uma de suas falas igualmente conhecidas, para começo de conversa: “Só sei que nada sei”. Pode parecer um paradoxo ou uma frase de efeito, à primeira vista, mas constitui um pensamento que define muito bem um filósofo: enquanto a média das pessoas se equilibra sobre supostas certezas, o filósofo encontra segurança exatamente em suas incertezas, ou seja, em saber que seus conceitos sobre o mundo são todos provisórios, apenas o melhor que logrou obter até agora, mas possui a permanente determinação de utilizar as oportunidades de aprendizado que a vida lhe oferece para aperfeiçoar estes conceitos. Em suma, o filósofo é sempre um ser em construção e um aprendiz.
Tem certezas? Sim, está certo de que o sentido da vida humana é o aperfeiçoamento, e que há um aperfeiçoamento próprio dos seres humanos, que reside na compreensão e vivência de valores universais, tais como fraternidade, bondade, justiça etc. Para isso, vasculha o passado e observa o presente, atento e curioso, sempre buscando elementos que possam lhe servir de tema de reflexão sobre como melhor entender e viver estes valores. Ou seja, ama Platão, mas está disposto a aprender com o João da Silva, se este tem algo a lhe oferecer que fornece resposta satisfatória às suas questões sobre a difícil arte de viver como homens. Ou seja, não “segue” ninguém, mas é fiel a algo, em si mesmo, que tem sempre sede de coerência e crescimento. De Platão a João, sabe que todos os homens são duais, uma mistura de “um e outro”, de luz e sombra, e que sempre se pode aprender um pouco com sua luz e oferecer-lhe algo da nossa, como essência da arte de viver.

A Filosofia isola? Nunca. É muito mais fácil para alguém que cresce na compreensão de si mesmo e do homem em geral entender as razões e necessidades que movem aquele parente excessivamente aficionado por uma linha religiosa ou o amigo ligado de forma muito entusiástica a uma visão política em especial, do que alguém que não o faz. O fenômeno humano, com suas buscas e angústias, conscientes ou não, lhe interessa, e sempre busca formas de entender onde se localiza cada homem, quais as necessidades que o levaram até aí, e como ajudá-lo a, partir do que é e de onde está, subir mais um degrau rumo à realização humana.

Questionador? Sempre, mas não pelo prazer de contestar, e sim pelo amor à investigação e compreensão da vida. Como uma criança, a observação a fundo de cada detalhe e momento, banal para outros, o deslumbra. Ama a figura de um Da Vinci que se debruça sobre uma simples planta, copiando, meticuloso, o intrincado desenho das nervuras de suas folhas. Nunca responde a circunstâncias semelhantes de maneira igual: uma mesma pergunta feita em dois tempos apresenta o matiz da transformação de quem fala, de quem ouve, do tempo. Sempre diferencia, examina e se detém no aprendizado que cada peculiaridade da vida lhe traz; ama dialogar com a vida... cada nova ´possibilidade descoberta lhe traz mais liberdade: um mundo mais amplo por onde transitar e investigar; por isso, não teme o novo, nunca rejeita nada “a priori”, nem julga o que não conhece.

Absolutamente fiéis e obedientes àquilo que percebem como valores universais, humanos, nobres e justos, são os filósofos os homens mais livres que há: não carregam o peso de presunções nem de preconceitos: estão sempre leves e puros ante a vida. Não temem o conhecimento, pois sabem que este lhes dá sempre mais espaço vital; dispostos a se reconstruírem e a crescerem, não carregam nem sequer o peso de uma identidade rígida e “concretada” pela inércia do que foram até aqui. Não temem pensar como todos nem diferente de todos; não temem pensar, enfim.

Não buscam recompensas senão a de serem cada vez mais humanos, nem temem castigos que não a ignorância e o estatismo. Difícil manipulá-los, pois nada que querem ou temem está fora de si próprios. Amantes da natureza humana são dos que mais a compreendem, e com ela se comprometem. Por onde passaram os maiores dentre eles, na História, varreram a barbárie e a ignorância com uma chamada poderosa em prol da fraternidade, do ecletismo e do autoconhecimento.

Seja lá o que for que se denomine como seita, há que saber que nada há seja tão antípoda a este conceito quanto a Filosofia, esta saudável e luminosa arte ou ciência, que sempre trabalhou para desenvolver o senso e o discernimento humanos.

Lucia Maya - Filósofa e diretora da NA Brasília

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Quando os bons vão embora...

Morre mais um ícone, um símbolo, um mito. Aos poucos a humanidade se despede dos poucos exemplos que lhe restaram. Lentamente vão embora nossas referências de bondade, beleza e justiça. O homem se torna mais duro, mais débil, mais monstro e mais distante de Deus. Quando interrogado sobre a obra mais bonita da humanidade, Pico Della Mirandola respondeu: o homem. Eis o único ser de toda a natureza que tem o direito de escolher entre os instintos mais primitivos e animalescos, ou a mais nobre e honrada forma de Ser. Aquele que transita entre a terra e o céu, entre os animais e os deuses. Só que ser Deus exige do homem a capacidade de dominar seus instintos, de se sobrepor à preguiça, à raiva, aos preconceitos, à vaidade, à mentira, aos desejos. Limpar a alma das armadilhas da personalidade, abrir o coração com pureza, com amor. É preciso ser grande não em tamanho, mas em alma. Servir ao outro, compreender o tempo de cada um, ser humilde para saber o lugar que ocupa e grande em caráter para lutar com coragem contra os ‘amos da caverna’. Mandela foi um deles, que desceu até as profundezas sem nunca ter se identificado com elas. Que voltou aos homens por amor em busca do ideal que vibrava em seu âmago. Âmago de Ser Humano. Mas Mandela, Martin Luther King, Marco Aurélio, rei Arthur, e tantos outros seres históricos e míticos eram tão diferentes de nós? Como alguém pode passar 27 anos na prisão e manter-se puro mesmo em relação àqueles que o julgaram e condenaram, enquanto a maioria de nós, mal consegue perceber o outro a nossa volta? Será que a unidade que Mandela via em tudo, pode ser vencida pelo separatismo vigente? Será que somos feitos de matéria diferente? Será que a grande safra dos bons deixou-nos a míngua em meio a verdades egoístas e o individualismo perene? O que separa, afinal, homens como esses de nós, tão humanos quanto? Vontade! Eles fizeram o que tinha de ser feito, o Dever estava acima dos desejos, a vontade sobrepunha a inércia, o caráter estava acima dos interesses pessoais. Eles faziam não porque alguém estava vendo, faziam porque era o certo fazer. Enquanto suas vozes internas gritavam por glória e virtude, nossas vozes são abafadas por medo, desinteresse, inconsciência. O homem é o mesmo, os ideais é que mudaram! Lamentar a morte de Mandela não fará que as coisas mudem. Construir homens e mulheres conscientes, sim. Podemos escolher entre permanecer como barro ou sermos lapidados. Escolhemos todos os dias. Até quando, vamos escolher errado? Caroline Pilz Pinnow - Estudante de Filosofia

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Um dia, há 57 anos...

Um dia, um jovem se surpreendeu com o conhecimento de homens do passado, guardado em antigos livros, hoje quase esquecidos por uma civilização que pensa que só o novo tem algum sabor e sentido... Esse jovem, com o espírito de aventura próprio dos jovens, sonhou com homens como Sócrates, Platão, Aristóteles e tantos outros, vivendo em nossos dias, caminhando atentamente pelos caminhos atuais, buscando saídas para os enigmas de sempre... buscando respostas para a vida, testando-as em suas próprias vidas e ensinando através do exemplo. Homens nobres, inspiradores, cujo exemplo pudesse ser cada vez mais um contundente chamado para uma forma mais humana de viver... Sentiu a força desse chamado ecoando através de páginas escritas há mais de dois mil anos... sentiu como ainda eram presentes e verdadeiros, e quis mostrar isso ao mundo.
 
Esse jovem, Jorge Angel Livraga, fundou uma pequena escola de filosofia prática, de filosofia como arte de viver, chamada Nova Acrópole. Com seus antigos livros, grandes expectativas e escassos recursos, começou a ensinar, exemplificar, praticar e passar adiante este velho sonho; mais do que ele mesmo ousou sonhar, os homens responderam a esse convite, que não vem do passado: vem de sempre. Em todos os tempos, essa chamada da condição humana, querendo se realizar e se expressar, em sua plenitude, não cessa de pressionar, a partir de dentro; ou seja, desde que o homem é homem, o homem sonha ser Homem; e esse é o mais belo sonho que se pode ter e compartilhar.
 
Lá se vão 57 anos... a vida biológica daquele jovem sonhador já concluiu seu ciclo, embora sem conseguir arrebatar, em nenhum momento, sua enorme capacidade de criar e concretizar sonhos. E Nova Acrópole completa 57 anos... o que significam 57 anos de vida de uma escola cujo produto é Vida, na sua melhor expressão? Significa pedagogia, em seu sentido original, como paidos + agein, isto é, a arte de “conduzir crianças” para que se tornem adultos em todos os planos: responsáveis para consigo mesmos e para com a Humanidade; comprometidos em minimizar algo do sofrimento humano; buscadores da ideia do Bem para praticá-lo de forma cada vez mais eficiente e inteligente; inspirados pela honra, generosidade e beleza...poderosos inimigos do egoísmo, em todas suas múltiplas manifestações.
 
Esse é o produto gerado por Nova Acrópole... há lugar para ele, no “mercado”? Se você acha que sim, bata palmas conosco em homenagem a essa aniversariante. Há quem diga que bater palmas, no teatro grego, era uma forma da plateia invocar os espíritos protetores das artes. A arte de viver, que é a Filosofia, tem um poderoso protetor (e protegido): o espírito humano; ele merece as suas palmas!

 
Diretora Adjunta de Nova Acrópole Brasil
Lúcia Helena Galvão

domingo, 13 de julho de 2014

Um mito para se viver

Há poucos dias, vivi em algum grau o que várias vezes já repeti em sala de aula para os meus alunos: sabe aquele instante em que o tempo parece congelar, e tudo acontece em horas, quando para você foram poucos minutos de pura Vida escorrendo entre seus dedos?

O relógio em meu pulso completou sua saga no máximo cinco vezes, porém meu coração pulsava como se o tempo fosse eterno. Lembrei-me do trecho do épico livro da tradição hindu, o BhagavadGita, que conta a história de um herói, que ao entrar num campo de batalha, até os Deuses pararam para vê-lo lutar. Um verdadeiro “tempo fora do tempo”.

Então, comecei a refletir sobre os Mitos, e como eles foram feitos para durar para além de sua própria existência. Que oportunidade bonita com a qual o Destino me presenteou: poder viver ideias, histórias, batalhas... quão belo é poder sonhar.

Lembrei-me ainda do tempo em que eu era criança, e que para dormir não era suficiente um cobertor, um travesseiro, ou em épocas mais remotas, um ursinho de pelúcia. Não bastava o “beijo de boa noite” dos meus pais, ou o “durma bem, meu irmão querido”. Havia a necessidade de um ritual de passagem: as histórias antes dormir contadas por minha mãe ou por meu pai. Às vezes, era para eles um sacrifício manterem-se acordados até o “e viveram felizes para sempre... FIM!”. Hoje entendo o valor deste sacro ofício de ensinar e educar pacientemente uma criança.

As histórias de príncipes, princesas, peixinhos dourados, meninos levados...todas elas ficarão para sempre marcadas em meu coração, porém, mais profundas do que estas marcas são as lembranças de quão importante era ir me desconectando da realidade de um dia cansativo em meio a brincadeiras e outros desgastes que só as crianças têm, para adentrar numa realidade ainda mais real, o maravilhoso mundo dos sonhos. Era como se aquelas histórias fossem uma preparação para que a entrada neste outro mundo não acontecesse de uma vez só.

Gostar de histórias e contos de fadas quando se é criança tem o seu valor, mas continuar gostando de tudo isso depois de adulto tem também o seu sabor. Não tenho vergonha de dizer que sigo acreditando em peixinhos dourados, bruxas e dragões.  Porém, hoje os vejo para além dos livros e filmes, vejo-os todos os dias, em cada desafio e em cada novo aprendizado que retiro das experiências da vida.

Neste tempo fora do tempo ao qual me referi no início desta reflexão, revivi a saga de um Cavaleiro Andante que fez da lança seu escudo, do escudo sua morada, da morada seu castelo. Mergulhei no mar de sonhos de um homem que se fez real pela magia de sua própria imaginação. De moinhos fez gigantes, de mulheres fez donzelas, de parceiro fez amigo fiel escudeiro.

Já não sabia mais se estava nas estradas da Espanha ou na comemoração de aniversário de uma pessoa querida, também cavalheiro, também andante, mas não mais de triste figura, pois seu sorriso expressava toda alegria de seu coração. Em meio ao amarelo solar e o vermelho vibrante, uma bandeira flamejante fez-se bolo, a uva fez-se brinde, e um mito fez-se festa!

Em um palco onde sombras e homens se mesclavam, representamos este teatro da vida real e imaginária daqueles que reconhecem como sentido de sua trilha a estrela que brilha no céu da noite escura dos tempos. E neste palco, pronunciamos as falas que diziam muito por nós: “há homens que dormem e não sonham, outros que sonham despertos, há ainda os que matam seus sonhos, e aqueles que lutam sonhando. Os idealistas acreditam que não há impossíveis, mas sim, impossibilitados. Impossibilitados de sonhar, de viver uma saga heroica, de lutar por tudo aquilo que acreditam”.

Dias antes, li numa revista já coberta pelo marrom envelhecido dos anos, os versos que seguiram estas frases: “Não é loucura viver por um Ideal, nem loucura crer em Damas e Cavalheiros, ou render culto à honra e lutar pela justiça. Não é loucura crer em Deus, e amar todo o nobre e todo o bom. Não é loucura confrontar-se com gigantes para convertê-los em moinhos de vento. Não é loucura, neste mundo de egoísmo e violência, ser idealista. Não é loucura lutar apaixonadamente pela construção de um mundo novo e melhor. Se és idealista, o Quixote eterno... está dentro de ti!”

Hoje, trazendo à memória todas estas imagens, reafirmo com toda a força do meu coração: não é loucura crer em contos de fadas, não é loucura crer em mitos e heróis. Loucura mesmo é acreditar que a solução das nossas vidas está naquilo que o tempo pode roubar de nós.

Crônica de Aline Almeida

 

 

sábado, 5 de julho de 2014

O Mito de Ulisses e a conquista da alma humana

"Na história de Ulisses não há exércitos inimigos propriamente ditos, há obstáculos que a natureza coloca em seu caminho, e para vencê-los há que ter Inteligência, destreza, coragem e força”. O trecho acima ilustra a primeira página da Odisseia de Homero e mostra um pouco do que a obra reserva. O personagem principal desta história é o herói greco-romano Ulisses, autor do Cavalo de Troia, o presente que os Gregos deram aos Troianos e que pôs fim a quase 10 anos de guerra. Mas a saga de Ulisses vai muito além desta guerra é o que garante a professora de filosofia Aline Almeida. Ela apresentará o Mito de Ulisses, neste sábado (06/07), às 18h, na Nova Acrópole Cuiabá.

 
História e mitologia se confundem em meio a tantos fatos que fazem parte dos livros ou foram transmitidos verbalmente ao longo de inúmeras gerações. Mas afinal, quem foi Ulisses? O que buscava? Por que retornar a Ítaca? E Penélope, o que pretendia ao tecer e destecer seu manto a espera do amado? Para a professora, o mito está repleto de símbolos que permitem uma leitura filosófica capaz de transportar Ulisses para os dias atuais.  
 
Aline explica que o mito representa todas as provas que passamos diariamente para relembrar quem somos, de onde viemos e para onde regressaremos. “A proposta é analisar os personagens e os principais acontecimentos da história fazendo uma relação com a própria saga humana na conquista de si mesmo. Ulisses representa o homem que tem que passar por algumas provas, ou seja, desafios que trazem ensinamentos e oportunidades que permitem ao herói retornar ao contato com sua Alma Imortal, representada no mito por Penélope, a esposa paciente e fiel”.
 
A Nova Acrópole Cuiabá está localizada na Rua Mané Garrincha, no 82, Bairro: Jardim Alvorada (Atrás do Hospital Universitário Júlio Muller). Mais informações pelo fone: (65) 2129-9002 /9919-1700 ou no facebook.com.br/NovaAcropoleCuiaba

quinta-feira, 26 de junho de 2014

FILHOS – A DIFÍCIL ARTE DE EDUCAR

Pais não são sinônimos de educadores. E se estes últimos vêm enfrentando dificuldades cada vez maiores dentro de um sistema educacional ineficiente, incapaz de atingir resultados satisfatórios no âmbito da formação do ser humano, o que dizer dos primeiros, que desde o início reclamam da ausência de um “manual de instruções” que os ajude a tomar as decisões certas em meio a tantas questões pessoais envolvidas no relacionamento com seus filhos.
A própria idéia de educação vem sofrendo mudanças constantemente, fragmentando-se e revestindo-se de elementos artificiais e mecânicos. Uma sombra imperfeita e distante de seu verdadeiro sentido de “educire”, que visa formar o caráter para que as potencialidades humanas se desenvolvam e se expressem de maneira natural. A educação, hoje, está associada à informação, à obtenção de conhecimentos externos que conduzam à realização baseada na possibilidade de acesso aos bens materiais.

A Disciplina seria um “mal necessário”, assim como o são o trabalho, a ordem e o cumprimento do dever. Assim, diante da distorção dos fins e princípios, também os meios carecem de referencial. Já não se sabe mais como educar as crianças e os jovens, como promover entre eles o valor, o respeito e a responsabilidade; como fazer com que aprendam as lições da experiência para que sejam melhores.

O papel da Filosofia na Educação

A história nos apresenta diversos exemplos de escolas e sistemas de ensino baseados na Filosofia que, à maneira clássica, segue a trilha dos conhecimentos universais e atemporais transmitidos pelos grandes sábios, que tratam das questões fundamentais do ser humano. Independentemente do local ou época, essas escolas foram as responsáveis pela formação dos grandes homens e mulheres da história, daí surgiram os maiores heróis, artistas, cientistas, daí surgiram “Alexandres”, “Platões” e “Leonardos”.

Através da filosofia, o ser humano tem a possibilidade de se conhecer-se e dominar-se; de descobrir o seu papel no mundo e viver sua vocação de acordo com sua própria natureza. É o despertar da consciência, que permite ao homem viver em harmonia consigo mesmo e com todas as coisas.

Aplicação Prática

Essa educação natural se aplica em qualquer época e em quaisquer circunstâncias, pois não se tratam de modismos ou tendências mutáveis. Estamos nos referindo aos valores essenciais do ser humano, como discernimento, atenção, concentração, memória, coragem, amor, perseverança, resistência, determinação, honra. Isso está sempre, ainda que sob a forma de sementes, sob espessas camadas de terra mal cultivada.
A criança precisa desde cedo aprender a gostar do que é certo e bom, ter contato com a beleza, a ordem, e ter sempre à sua frente bons exemplos que a inspirem a querer ser melhor. Essa é uma tendência natural, a criança pede e necessita de referenciais e limites, embora aparentemente se anteponha aos mesmos. Também ela tem uma tendência natural ao dever e a responsabilidade, gosta de ajudar e se sente importante por ser útil aos demais. Isso deve ser estimulado através de incentivo e pequenas tarefas que lhe possibilitem a alegria dessas vivências.

Disciplina

Tudo na vida necessita de ordem para se desenvolver. E existe uma ordem natural que emana da autoridade dos pais. No entanto, as crianças possuem um ritmo próprio que precisa ser respeitado. É preciso entrar no seu ritmo para fazê-las entender e não ao contrário, como normalmente se faz, com discursos e métodos que funcionariam muito bem para os adultos, mas que para os pequenos trazem apenas pressão, frustração e insegurança.

A criança age com retidão quando acredita em seu potencial. Por isso, não basta mostrar aonde chegar e o que fazer, ela precisa descobrir nela o que se espera dela. Por exemplo, caso se espere dela uma atitude corajosa, não adianta falar que ela precisa ter coragem, simplesmente; e muito menos dizer que ela precisa deixar de ser “medrosa”. Tem que mostrá-la a coragem que existe dentro dela, afirmar que está aí, lembrá-la de antigos atos corajosos e valorizá-la por isso.

Há uma linguagem própria, lúdica, cheia de exemplos e analogias. As coisas devem ser explicadas não de forma racional, mas com muito amor, compreensão e paciência. Isso não significa ceder às pressões da criança, ao contrário, demonstra firmeza e persuasão para conduzi-la de forma correta.
Mas as crianças costumam testar seus limites, e se, em primeira instância não funcionou, é natural que exista alguma conseqüência. Essa conseqüência deve ser o mais natural possível e isso afasta qualquer possibilidade de violência. A violência diz respeito mais ao posicionamento interno do que à atitude externa. Há palavras que ferem mais do que qualquer gesto.

É importante que fique clara a idéia de direitos e deveres. Para que tenhamos direitos precisamos primeiro cumprir com os nossos deveres. Ante uma atitude errada reincidente, melhor do que aplicar um castigo qualquer, é privar a criança de algo que ela goste, e mostrar para ela que isso é uma escolha dela. Que ela pode ter o que para ela for importante desde que faça sua parte.

Disciplina é a virtude do discípulo, aquele que aprende e aplica, e com isso desenvolve-se de forma consciente. Desenvolvimento requer treinamentos e superações, e quanto antes comecemos esse processo, mais fluido e natural será o caminho.

Natália Ramon
Revista Esfinge

domingo, 15 de junho de 2014

IDENTIDADE E AUTOESTIMA

Para alcançar um bom nível de autoestima, devemos descobrir nossa identidade: Quem sou? O que sou? E o mais importante e decisivo ainda, o que quero ser?

Ou seja, consciente ou inconscientemente, todos nós abrigamos opiniões e emoções sobre nós mesmos: segurança ou insegurança, confiança ou desconfiança, fé em nós e em nossos projetos ou falta de entusiasmo. Todos esses elementos dependem diretamente do nível de autoestima que desenvolvemos. Tudo isso incide na forma com que olhamos as coisas, em como aproveitamos as oportunidades que a vida nos oferece e como nos relacionamos com os outros.

Com uma autoestima saudável, nos damos conta de nossa própria vida e assumimos uma atitude responsável e ativa na busca de nossas próprias metas. Porém, o que é a autoestima? Como se forma? Quais são seus componentes? Antes de falarmos sobre nossa versão, vejamos algumas das definições de psicólogos e pesquisadores:

Alguns utilizam a palavra “estima” no sentido de “apreço, carinho”, e vinculam a autoestima ao conjunto de emoções e sentimentos que temos por nós mesmos. Esse enfoque explica a autoestima  como um dos componentes dos “autoesquemas” ou “autossistemas” (Walter Riso). Na mesma linha, outros autores a definem como o sentimento pessoal que surge da satisfação ou insatisfação alcançada, pela forma com que conseguimos êxito na execução das metas que nos propomos (William James). Há quem a relacione a processos avaliativos, vinculados a nossas opiniões e juízos, assim como a processos objetivos e consciências que se dão, na maioria das vezes, de forma inconsciente dentro de nós.

Nathaniel Branden a relaciona com a consciência e a define como a disposição em considerar-se competente para fazer frente aos desafios básicos da vida e sentir-se merecedor da felicidade. Também com a reputação que chegamos a ter com respeito a nós. Segundo Branden, a autoestima teria dois componentes: o sentido da eficácia pessoal e o respeito por si mesmo.

Coopersmith afirma que é a avaliação aprovadora ou desaprovadora que se faz sobre si mesmo continuamente.

Carlos A. Chiari

Revista Esfinge

Canto à Justiça Futura


Não posso evitar que diante da dor,
a terrível dor da humanidade,
meu peito pareça, por vezes,
explodir de dor e impotência
por não poder aportar com tua presença entre os homens.

Se pudesse, empenharia meu sangue
e cada célula deste corpo para te trazer ao mundo,
deste corpo que nem sequer me pertence,
e nem é nele que mais se verte a dor de tua ausência.

Se necessário fosse, desaguaria minha alma em lágrimas,
mas lágrimas, já as temos tantas
que quase afogamos, em redemoinhos de uma dor cega,
que gira sobre si mesma, sem encontrar a saída.

És mistério, és enigma,
um velho Mestre dizia
que és ordem e harmonia.
Seja lá o que fores, senhora Justiça,
saiba que a ânsia por ti seca as vidas
e esteriliza as esperanças entre nós.

Somos pobre raça de mortais,
mortais por opção,
vagando em desordem,
arrastando-nos em andrajos,
sacralizando a miséria,
ferindo-nos torpemente.

Porém, algum lábio há de achar
a sílaba sagrada.
Uma voz há de emitir
a palavra transcendente
que te encarnará entre nós,
que irá te evocar novamente,
Eterna Deusa em nova morada.

Dói-me tanto não ter esse nome,
não ter podido conquistá-lo,
pois, talvez, alguns entre nós
já não possam mais esperar...

Há desespero nos olhos
e tanta dor pelo mundo,
mas esse esboço de apelo
fenece, afônico, mudo.

Os lábios não exprimem o que o coração conhece,
o calor da evidência da tua presença não aquece a voz.
Mas, curto ou longo, esse trajeto há de ser cumprido,
e alguém dará à luz o Nome tão esperado.

Aguardemos, não sem alguma inevitável ansiedade.
Mas, seja como for, quero que saibas que, ao chegares,
celebrarei minha alegria aos quatro cantos do mundo,
farei intermináveis cantos em teu nome,
dançarei à tua volta até quedar-me extenuada,
pois o tempo será Eterno, e a vida será Glória.
E as cinzas dos nossos corpos
e o fogo de nossas almas,
num amálgama perfeito,
serão o pavimento
sobre o qual erguerás a nova História.

Lúcia Helena Galvão